Licitações, bom negócio para pequenas empresas
Compras
federais cresceram 375% de 2006 para 2007
A Lei
Geral das Micro e Pequenas Empresas, que começou a
valer em julho do ano passado, já tem efeitos
imediatos nas compras do Governo federal: o valor
gasto com empresas de menor porte foi de R$ 9,5
bilhões em 2007, crescimento de 375% em relação a
2006. Além da nova lei, a difusão das licitações por
pregão eletrônico também favorece pequenas e
microempresas. Participar de licitações, porém,
requer cuidados na gestão: é preciso planejamento
para agüentar eventuais atrasos de pagamento e
capacidade para reduzir margens em prol de grandes
contratos. "Já tive minha margem esmagada uma vez,
pois o contratante demorou muito para efetuar o
pedido", relata Amarildo Tavares, sócio da Conde Med,
especializada em produtos ortopédicos.
Boom nas compras públicas
O
principal cliente nacional, o governo, já não é
exclusivo das grandes empresas. Segundo o Ministério
do Planejamento, Orçamento e Gestão, o volume das
compras públicas federais feitas em pequenas e
microempresas (MPEs) aumentou em 375% de 2006 para
2007: passou de R$ 2 bilhões para R$ 9,5 bilhões. Em
2007, as MPEs responderam por 27% do total de
compras federais R$ 34,5 bilhões. O aumento é
justificado pelo órgão como resultado da aplicação
da Lei Geral das Micro e Pequenas Empresas, aliada
às facilidades de participação das licitações por
meio do pregão eletrônico. Planejamento financeiro
para agüentar atrasos de pagamento e capacidade de
encolher margens são as principais recomendações
para as pequenas empresas que pretendem faturar com
os grandes pedidos dos governos.
A participação no número de itens fornecidos pelas
empresas de pequeno porte atingiu 60% do montante
total adquirido ao longo do ano passado. O balanço
também mostra que as MPEs forneceram cerca de R$ 8
bilhões (48%) dos R$ 16,5 bilhões contratados por
pregão eletrônico no Governo federal em 2007. O
volume total de compras dos órgãos e entidades da
administração pública aumentou de R$ 27,3 bilhões em
2006, para R$ 34,5 bilhões em 2007, enquanto as
compras sensíveis a participação do segmento saíram
de R$ 21 bilhões para R$ 25,7 bilhões.
Dois itens da Lei Geral devem ser destacados como
responsáveis por resultado tão expressivo. O
primeiro deles se refere à exclusividade de
concorrência concedida para MPEs em compras
governamentais de até R$ 80 mil. Entre outubro de
2007 e fevereiro de 2008, o Governo federal
contratou aproximadamente R$ 1,3 bilhão por meio de
licitações do tipo. Esse valor representa 12% dos R$
10,8 bilhões licitados pela modalidade de pregão
eletrônico no período.
A preferência em caso de empate é apontada como o
outro fator determinante para o maior acesso das
pequenas empresas às compras públicas. Entende-se
por empate nas licitações situações em que as
propostas apresentadas pelas MPEs sejam iguais ou
até 10% superiores à proposta melhor classificada.
Nesse caso, as empresas de pequeno porte passaram a
ter a oportunidade de apresentar proposta de preço
inferior àquela considerada vencedora da
concorrência. A nova legislação prevê ainda a
subcontratação de MPEs por empresas de maior porte,
quando houver possibilidade de fragmentação dos
serviços vendidos ou de fornecimento de lotes
reduzidos.
Sônia Moura, diretora superintendente e fundadora da
Conlicitação, consultoria especializada em prestação
de informação sobre licitações, acrescenta outras
vantagens da concorrência on-line, que ela considera
"um divisor de águas no mundo das licitações". O
primeiro ganho é a maior transparência desse tipo de
negociação, que não depende mais dos convites.
"Antes eram chamadas para as licitações apenas as
empresas que estivessem em um cadastro prévio. Isso
exigia que o empresário tivesse contatos e
facilitava a corrupção. Agora todos têm acesso às
informações dos sites, inclusive dados posteriores à
realização da concorrência, como o nome da empresa e
o preço vencedor", afirma.
Diversos sites já disponibilizam os pregões
eletrônicos www.licitacoes-e.com.br, do Banco do
Brasil; www.comprasnet.gov.br, do Governo federal; e
www.caixaeconomica.gov.br, são alguns deles. Essa
modalidade de negociação também vem reduzindo a
incidência da inadimplência, principal queixa de
empresários que participam das compras
governamentais. De acordo com a diretora, como os
sites têm cooperação de instituições financeiras
públicas, os bancos cobrem a dívida caso o orçamento
do poder público esteja comprometido.
Marcos Vinicius Macedo Pessanha, consultor da Selic,
assessoria também especialização em licitações,
ressalta que a inadimplência é questão fundamental
para as MPEs, que nem sempre resistem a atrasos de
pagamentos em função do baixo capital de giro
disponível. "Essas dificuldades podem implicar em
uma diminuição da liquidez da empresa e abalar sua
saúde patrimonial. É interessante que tais empresas
tenham uma capacidade de absorver eventualmente
determinados impactos para negociar e vender para o
poder público, que nem sempre se mostra como bom e
assíduo pagador", afirma o advogado, especialista em
licitações e direito público.
William Teixeira, encarregado de licitações da
Metalvest, empresa mineira especializada na produção
de troféus e placas, explica que esse tipo de
problema é mais comum na esfera municipal. O
profissional afirma não participar mais de
licitações com a prefeitura de Palmas, em Tocantins.
"Fornecemos produtos há cerca de cinco anos e, até
hoje, a prefeitura não nos pagou", queixa-se.
Teixeira acrescenta ainda que os governos municipais
continuam recorrendo a convites e evitando os
pregões eletrônicos, o que restringe o acesso.
Pedidos. Não é só a inadimplência que pode gerar
problemas, mas a demora no requerimento dos produtos
ou da prestação de serviços da empresa vencedora da
licitação, como destaca Amarildo Tavares, sócio da
Conde Med. A empresa de produtos ortopédicos
participa com freqüência de licitações e venceu em
fevereiro um edital para fornecimento ao Instituto
Nacional do Câncer (Inca). "Já tive minha margem
esmagada uma vez, pois o contratante demorou muito
para efetuar o pedido e, nesse tempo, o preço dos
insumos aumentou significativamente", conta.
De acordo com Tavares, a solicitação de fornecimento
de modo parcelado traz vantagens para o pequeno
empresário. Como ponto positivo, ele aponta a
possibilidade de participar da licitação mesmo sem
ter todo o material estocado. O poder público tem o
prazo de um ano para requerer os itens, e, após o
pedido, a empresa contratada tem 15 dias para
executar o fornecimento. Tavares garante nunca ter
atrasado as entregas e enfatiza a importância de
manter um relacionamento estreito com fornecedores.
"Para quem atua no varejo, é importante consultar os
fornecedores e deixá-los informados sobre todos os
prazos. Assim, não se corre o risco de não ter o que
entregar quando solicitado", recomenda.
Marcio Barbosa, técnico em telecomunicações que
trabalha na área de licitações na Bentel Comércio e
Serviço de Representação Teleinformática, também
aponta a dependência de fabricantes como um dos
entraves. De acordo com o profissional, essas
indústrias tendem a oferecer itens a preços mais
baixos para multinacionais, que compram em escala
maior do que as MPEs. "Ficávamos à mercê das grandes
empresas, mas a nova lei nos favoreceu, tanto no
caso das compras exclusivas quanto nos casos de
empate", revela.
De 15% a 20% do faturamento da empresa é advindo das
compras públicas e a meta é expandir esse percentual
ao longo do ano que vem. Barbosa explica que os
governos são um importante cliente para as empresas,
em função de ter compras contínuas ao longo do ano,
predeterminadas em função do orçamento, e em
quantidades significativas. Além disso, ter
trabalhado com instâncias públicas dá a empresa
credibilidade junto ao mercado, aos demonstrar
capacidade de fornecimento e preços competitivos.
Má leitura do edital é o principal erro
A impossibilidade de se contratar uma assessoria
especializada na área de licitações leva pequenos e
microempresários a incorrerem em erros passíveis de
impugná-los de concorrências. A maior parte dos
equívocos é resultado de uma leitura inadequada do
edital. Marcus Vinicius Macedo Pessanha, consultor
da Selic, assessoria especializada em licitações,
explica ser comum a apresentação da documentação de
forma inadequada, diferente da descrita no edital.
"Essa exigência foi relativizada por meio dos
artigos 42 e 43 da Lei Geral das Micro e Pequenas
Empresas, que desburocratizaram o procedimento. No
entanto, toda atenção é necessária", diz.
Outra falha comum apontada pelo consultor é o
desconhecimento do próprio produto e das condições
de contratação, também presentes no edital. Uma
pequena inadequação pode eliminar um concorrente e
até impedi-lo de participar das oportunidades
durante os próximos cinco anos. No entanto, a
leitura do edital pode ser tarefa difícil. De acordo
com Marcos Silva, encarregado de licitações da
Biosys, especializada em análises clínicas e
químicas, as informações nem sempre estão claras,
pois existem muitos editais mal redigidos.
A empresa tem dez anos de atuação, comercializando
produtos e serviços, e tem 17 funcionários. Na área
de atuação da Biosys, existem licitações voltadas
para órgãos de saúde e autarquias ligadas à área,
com o fornecimento de reagentes laboratoriais e
equipamentos de pequeno, médio e grande portes.
"Temos alguns contratos de fornecimento fechados com
órgãos de saúde de todo o País, originados em
licitações nas diversas modalidades como Pregão
Presencial, Pregão Eletrônico e Tomada de Preços",
afirma Silva.
Sônia Moura, diretora superintendente da
Conlicitação, consultoria também especializada em
compras públicas, acrescenta que as mudanças na
legislação vêm obrigando que as comissões de
licitação reformulem seus métodos. Agora, é preciso
que os pregões identifiquem e diferenciem as MPEs
das demais empresas, por exemplo. "Isso traz
complexidade para a esfera pública, inclusive quanto
à organização dos editais. Falta um amadurecimento,
que só vai ser conseguido com o tempo. As
localidades exigem medidas diferentes, em função da
abundância de MPEs em cada uma das regiões",
afirma.(RL)
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